Toques

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Lençóis

Era o mesmo sonho. A mesma pessoa, o mesmo acontecimento. Acordou assustado mais uma vez. Terceira vez esta semana. Era cada vez mais freqüente. E a cada dia tinha mais detalhes. Naquele dia não foi trabalhar e nem ficou em casa. Nem sabia onde estava... Ele lembrava disso desde seus 17 anos. Lembrava ou sonhava? Nem sabia onde estava... Agora aparenta 50, mas tem menos... Parecia que mais uma vez começaria. Atordoado de tanto pensar e de não pensar – os pensamentos pareciam vazios. Tomou um banho frio, pôs uma roupa limpa e deitou em lençóis quentes. Assim que gostava: recém passados. O sono demoraria chegar, claro. Mas o que são mais algumas horas no nada, no infinito e inacabado pensamento? Melhor que o sonho! Pensou. Tomou mais remédios: dois rosas um branco um verde um azul e um amarelinho e a cápsula rosa com vermelho... falta algum? Nem lembrava mais... Tomou com leite, ou o estômago dói. E remédio pra estomago é caro. Levantou: Esqueceu de mijar. Minha memória... Sobre os lençóis – agora frios, droga! – deitou. Acendeu um cigarro. Apagou. Acendeu outro. Fumou. Assim, deitado. Levantou e passou o ferro quente sobre os lençóis. Deitou. Lembrou do sonho e não quis mais dormir. Era sempre assim. Lembraria também no outro dia; com pesar, olheiras, e um sorriso que esconde um sentimento de culpa. Como será que... deixa pra lá! O não querer saber é mais fácil. Deixou pra lá, como sempre. O despertador tocou. Já?! Sorriu. Sabia seu dia estava começando, e que até às 23h estaria assim, pra mais tarde, tudo voltar ao normal: Insônia, tristeza, choros e pensamentos. Ou não-pensamentos... Nesta noite o mesmo sonho; e nele, ela ainda sangrava, apesar dos quase trinta anos passados. Gritou. Não agüentava mais. Agora os lençóis dele permaneceriam quentes, como os dela em seu sonho.